sábado, fevereiro 3

O urgente e o fundamental

Fonte : Revista Seleções
Data : Dezembro de 1983
Autora : Linda Tyler

Há assuntos fundamentais e outros meramente urgentes. Saber distingui-los pode proporcionar momentos inesquecíveis pela vida afora.

Certa manhã, faz pouco tempo, quando eu tentava acabar de lavar apressadamente a louça do café da manhã (para poder atacar 25 outros assuntos pendentes) senti um puxão na perna. “Mamãe, me põe no colo?”, pedia minha filha de dois anos, chupando o dedo e me abraçando.
“Agora, não, Laurinha. Tenho muito que fazer. Vá brincar que eu nano você depois do jantar.” Laura deu meia volta, obediente, com o cabelo louro a dançar aos seus passos curtos e roliços, e foi para o quarto dela.
Eu estava a mira-la, quando percebi que, dentro de uns seis meses, o andar dela seria diferente; o pedido, um pouco mais amadurecido; e este momento, uma recordação. Mas não gostei daquilo que eu iria ter para lembrar. “Laurinha, vem cá, vamos brincar, sim”, chamei eu. Enxuguei as mãos e, durante uma inestimável meia hora, eu a embalei e cantamos juntas. Por fim, ela se cansou e saltou para o chão para ir brincar bem alegremente sem mim.
Não me lancei outra vez à atividade logo em seguida. Empurrei para o fundo do pensamento a interminável lista de coisas para fazer fixada na porta da geladeira. Pensei nas vezes em que eu tinha trocado o que era fundamental pelo que era só urgente. Eu iria sempre acarinhar na memória aquele tempinho que Laura e eu havíamos passado hoje juntas. Nada poderia substitui-lo, mas eu quase o trocara por deveres que pareciam mais urgentes.
Lembrei-me de vezes em que o meu marido tinha dito “Linda”, venha sentar-se ao pé de mim um momento”; e eu tinha escolhido dobrar as últimas toalhas do secador de roupa ou fazer algum trabalho do comitê. Jim estaria sempre ali; eu iria para junto dele quando tivesse tudo em dia – havia sido essa a minha idéia. Eu era capaz de reparar isso agora. Momentos com Jim, especialmente a seu convite, eram preciosos demais para serem relegados para “quando eu puder”.
Ainda esta manhã eu tinha de novo pensado ir a pé com o meu filho até o jardim de infância, em vez de leva-lo de automóvel ao longo daqueles quatro quarteirões, mas parecia-me que havia tanto para fazer! Sorri ao perceber que havia já sete meses que eu vinha prometendo que começaríamos a ir a pé. Os momentos passados a andar vagarosamente por ruas ladeadas de árvores, antegozando o seu dia, ou ouvindo-o falar dele posteriormente, podiam contar-se entre os mais preciosos das nossas vidas. Como tinha eu permitido que tantas coisas tivessem prioridade sobre isso?
Pensando na minha terrível lista, considerei uma outra – a dos nomes de amigos íntimos com quem vínhamos perdendo contato por eu não ter tempo para escrever. Os mais penosos de considerar eram os pais de Jim e os meus, a mais de 3.000km de distância. Eu sabia que eles adoravam relatos das atividades das crianças; mas eu raramente conseguia escrever uma carta curta. Eu estava enganando os avós a respeito dos seus netos.
Levantei-me da cadeira de balanço com uma perspectiva nova daquilo que era importante. Tinha-me deixado apanhar a ponto de me esquecer das coisas preciosas que constituem a parte mais importante da minha vida. Reconheci que essas coisas fundamentais são realmente urgentes, mas muitas vezes o entendimento disto chega tarde demais.
Toalhas, a louça e os comitês podem esperar; filhos, marido, família e amigos é que, às vezes, não.

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