Fonte : Revista Seleções
Data : Janeiro de 1986
Autor : Caros Eduardo Novaes
Quando em dúvida, entre em pânico
Minha mulher teve de fazer uma pequena cirurgia e me convidou para ser seu acompanhante na casa de saúde. Tentei uma saída diplomática. “Escuta, Ana, sinto-me honrado pelo convite, mas será que o pessoal do hospital não vai dizer que você é uma mulher possessiva, que não larga o marido nem para ser operada? Além disso, não tenho nenhuma experiência como acompanhante.”
“Tenho a impressão”, replicou ela, “que você está morrendo de medo.”
Não adiantava mais fingir. “Não sei se vou conseguir”, confessei. “Tenho pavor de hospitais. Vê, já estou suando.”
Ana me acalmou, e uma amiga que já havia servido de acompanhante a quatro parentes assegurou-me que minhas obrigações seriam mínimas. “Você só terá de apanhar um copo de água de vez em quando e chamar a enfermeira”, disse ela. “Acompanhante trabalha menos que vice-presidente da república.”
Quando chegamos à recepção do hospital, Ana estava apreensiva, mas eu estava lívido e trêmulo. Enquanto eu preenchia a ficha, ouvi a enfermeira perguntar a Ana se minha operação era delicada. Desabei no chão, e ouvi todos gritando à minha volta.
“Levem-no para a Unidade de Tratamento Intensivo!”
“Tragam uma maca!”
“Uma ambulância!” comecei a berrar, esperneando. “Chamem uma ambulância!”
“Não precisa. O senhor já está num hospital.”
“Quero uma ambulância para me tirar daqui!”
Custei um pouco a me refazer. Subimos ao apartamento onde Ana iniciaria os preparativos para a cirurgia. Minutos depois chegou uma enfermeira que nem se deu ao trabalho de perguntar quem iria ser operado, e me mandou tirar a roupa.
“Tire você primeiro”, desafiei.
“Mas.... eu não vou ser operada.”
“Nem eu.”
“Mas então o que o senhor faz deitado na cama do paciente?”
A enfermeira obrigou-me a levantar. Com dor de cabeça, falta de ar, tonto, só consegui sair carregado por ela e por Ana. As duas me botaram sentado numa cadeira. Ana deitou-se para repousar, enquanto aguardava o momento de seguir para a sala de cirurgia. Eu me estendi, calado, num sofá que virava cama. De vez em quando pedia a Ana para me pegar um copo de água.
Quando o médico entrou no quarto para examinar a paciente, gritei da minha cama: “Primeiro eu, por favor. Sinto o corpo todo doendo.”
Mas o médico disse que estava tudo bem. Permaneci gemendo, até que as enfermeiras entraram para levar Ana para a cirurgia. Foi um instante dramático. Agarrei-me como pude à cama de rodinhas. As enfermeiras me empurraram e saíram com Ana. Fui pelo corredor, aos gritos: “Socorro! Por favor não me deixem sozinho!”
Nem vi quando Ana voltou da sala de cirurgia. Estava completamente dopado. Passamos os dois uma noite difícil. Várias vezes fui obrigado a chamar a enfermeira. No dia seguinte não sei o que seria de mim sem a Ana para me dar remédio, comida, para me levar ao banheiro.
Felizmente tudo correu bem. No terceiro dia Ana voltou para casa. Eu continuei no hospital mais alguns dias, convalescendo.
Data : Janeiro de 1986
Autor : Caros Eduardo Novaes
Quando em dúvida, entre em pânico
Minha mulher teve de fazer uma pequena cirurgia e me convidou para ser seu acompanhante na casa de saúde. Tentei uma saída diplomática. “Escuta, Ana, sinto-me honrado pelo convite, mas será que o pessoal do hospital não vai dizer que você é uma mulher possessiva, que não larga o marido nem para ser operada? Além disso, não tenho nenhuma experiência como acompanhante.”
“Tenho a impressão”, replicou ela, “que você está morrendo de medo.”
Não adiantava mais fingir. “Não sei se vou conseguir”, confessei. “Tenho pavor de hospitais. Vê, já estou suando.”
Ana me acalmou, e uma amiga que já havia servido de acompanhante a quatro parentes assegurou-me que minhas obrigações seriam mínimas. “Você só terá de apanhar um copo de água de vez em quando e chamar a enfermeira”, disse ela. “Acompanhante trabalha menos que vice-presidente da república.”
Quando chegamos à recepção do hospital, Ana estava apreensiva, mas eu estava lívido e trêmulo. Enquanto eu preenchia a ficha, ouvi a enfermeira perguntar a Ana se minha operação era delicada. Desabei no chão, e ouvi todos gritando à minha volta.
“Levem-no para a Unidade de Tratamento Intensivo!”
“Tragam uma maca!”
“Uma ambulância!” comecei a berrar, esperneando. “Chamem uma ambulância!”
“Não precisa. O senhor já está num hospital.”
“Quero uma ambulância para me tirar daqui!”
Custei um pouco a me refazer. Subimos ao apartamento onde Ana iniciaria os preparativos para a cirurgia. Minutos depois chegou uma enfermeira que nem se deu ao trabalho de perguntar quem iria ser operado, e me mandou tirar a roupa.
“Tire você primeiro”, desafiei.
“Mas.... eu não vou ser operada.”
“Nem eu.”
“Mas então o que o senhor faz deitado na cama do paciente?”
A enfermeira obrigou-me a levantar. Com dor de cabeça, falta de ar, tonto, só consegui sair carregado por ela e por Ana. As duas me botaram sentado numa cadeira. Ana deitou-se para repousar, enquanto aguardava o momento de seguir para a sala de cirurgia. Eu me estendi, calado, num sofá que virava cama. De vez em quando pedia a Ana para me pegar um copo de água.
Quando o médico entrou no quarto para examinar a paciente, gritei da minha cama: “Primeiro eu, por favor. Sinto o corpo todo doendo.”
Mas o médico disse que estava tudo bem. Permaneci gemendo, até que as enfermeiras entraram para levar Ana para a cirurgia. Foi um instante dramático. Agarrei-me como pude à cama de rodinhas. As enfermeiras me empurraram e saíram com Ana. Fui pelo corredor, aos gritos: “Socorro! Por favor não me deixem sozinho!”
Nem vi quando Ana voltou da sala de cirurgia. Estava completamente dopado. Passamos os dois uma noite difícil. Várias vezes fui obrigado a chamar a enfermeira. No dia seguinte não sei o que seria de mim sem a Ana para me dar remédio, comida, para me levar ao banheiro.
Felizmente tudo correu bem. No terceiro dia Ana voltou para casa. Eu continuei no hospital mais alguns dias, convalescendo.