segunda-feira, julho 31

Um desastre de acompanhante

Fonte : Revista Seleções
Data : Janeiro de 1986
Autor : Caros Eduardo Novaes

Quando em dúvida, entre em pânico

Minha mulher teve de fazer uma pequena cirurgia e me convidou para ser seu acompanhante na casa de saúde. Tentei uma saída diplomática. “Escuta, Ana, sinto-me honrado pelo convite, mas será que o pessoal do hospital não vai dizer que você é uma mulher possessiva, que não larga o marido nem para ser operada? Além disso, não tenho nenhuma experiência como acompanhante.”
“Tenho a impressão”, replicou ela, “que você está morrendo de medo.”
Não adiantava mais fingir. “Não sei se vou conseguir”, confessei. “Tenho pavor de hospitais. Vê, já estou suando.”
Ana me acalmou, e uma amiga que já havia servido de acompanhante a quatro parentes assegurou-me que minhas obrigações seriam mínimas. “Você só terá de apanhar um copo de água de vez em quando e chamar a enfermeira”, disse ela. “Acompanhante trabalha menos que vice-presidente da república.”
Quando chegamos à recepção do hospital, Ana estava apreensiva, mas eu estava lívido e trêmulo. Enquanto eu preenchia a ficha, ouvi a enfermeira perguntar a Ana se minha operação era delicada. Desabei no chão, e ouvi todos gritando à minha volta.
“Levem-no para a Unidade de Tratamento Intensivo!”
“Tragam uma maca!”
“Uma ambulância!” comecei a berrar, esperneando. “Chamem uma ambulância!”
“Não precisa. O senhor já está num hospital.”
“Quero uma ambulância para me tirar daqui!”
Custei um pouco a me refazer. Subimos ao apartamento onde Ana iniciaria os preparativos para a cirurgia. Minutos depois chegou uma enfermeira que nem se deu ao trabalho de perguntar quem iria ser operado, e me mandou tirar a roupa.
“Tire você primeiro”, desafiei.
“Mas.... eu não vou ser operada.”
“Nem eu.”
“Mas então o que o senhor faz deitado na cama do paciente?”
A enfermeira obrigou-me a levantar. Com dor de cabeça, falta de ar, tonto, só consegui sair carregado por ela e por Ana. As duas me botaram sentado numa cadeira. Ana deitou-se para repousar, enquanto aguardava o momento de seguir para a sala de cirurgia. Eu me estendi, calado, num sofá que virava cama. De vez em quando pedia a Ana para me pegar um copo de água.
Quando o médico entrou no quarto para examinar a paciente, gritei da minha cama: “Primeiro eu, por favor. Sinto o corpo todo doendo.”
Mas o médico disse que estava tudo bem. Permaneci gemendo, até que as enfermeiras entraram para levar Ana para a cirurgia. Foi um instante dramático. Agarrei-me como pude à cama de rodinhas. As enfermeiras me empurraram e saíram com Ana. Fui pelo corredor, aos gritos: “Socorro! Por favor não me deixem sozinho!”
Nem vi quando Ana voltou da sala de cirurgia. Estava completamente dopado. Passamos os dois uma noite difícil. Várias vezes fui obrigado a chamar a enfermeira. No dia seguinte não sei o que seria de mim sem a Ana para me dar remédio, comida, para me levar ao banheiro.
Felizmente tudo correu bem. No terceiro dia Ana voltou para casa. Eu continuei no hospital mais alguns dias, convalescendo.

2 comentários:

Bezerrra disse...

oBRIGADO PELO TEXTO. FAZIA ALGUM TEMPO QUE EU O PROCURAVA.

Bezerrra disse...

oBRIGADO PELO TEXTO. FAZIA ALGUM TEMPO QUE EU O PROCURAVA.