quarta-feira, julho 26

As três palavrinhas mágicas

Fonte : Revista Seleções
Data : Janeiro de 1986
Autor : Anya Bateman

Há coisas que realmente importam na vida, mas a verdade é que muitos de nós, freqüentemente demais; nos deixamos transtornar por meras bobagens.

“Vou ensinar a vocês três palavras que vão ajudá-los muito no mestrado e ao longo da vida”, disse um dia um experiente professor de pedagogia durante uma aula a que eu assistia. “Elas são a fórmula mágica para trazer paz ao seu espírito: ‘Não tem importância’.”
Que quereria ele dizer com aquilo?
“Um mestre sofre frustrações durante o seu dia, mas que, na verdade, não são grande coisa. Se ele se deixa abater por elas, corre o risco de se sentir arrasado”, explicou ele.
“Vou dar um exemplo. Suponhamos que um de vocês é professor e planejou cuidadosamente o seu dia. Há muita coisa a fazer. Vem um feriado e sua classe tem de completar um trabalho especial.”
“Aí um garoto adoece e vomita mesmo em cima do painel mural que os alunos estavam prestes a terminar. Nessa altura, você poderá ter duas reações: ficar desesperado ou limitar-se a dizer ‘Não tem importância”, e convencer-se de que não tem mesmo.”
“O realmente importante, ou seja, os sentimentos do pequeno que adoeceu, é claro que vai preocupar você; mas, quanto ao programa, você muito simplesmente o retomará no ponto em que interrompeu.”
Percebi a sabedoria contida em suas palavras e, como sofro facilmente de frustrações, anotei no meu bloco de notas, com letras bem gordas, a frase: “NÃO TEM IMPORTÂNCIA.” Decidi que não deixaria as minhas decepções e desilusões perturbarem a minha paz de espírito.
Deu resultado. Passei a andar muito mais feliz e a sentir-me mais realizada desde que comecei a ligar mais ao que era de fato importante e menos ao que não era. Mas apaixonei-me por um rapaz muito bonito, Phil Jackson. Para mim ele era sem dúvida um príncipe encantado. Uma noite, porém, saímos juntos e ele me disse, de maneira mais delicada que pode, que apenas me considerava uma amiga. Tudo o que eu idealizara construir com ele foi ali por água abaixo. Nessa noite, quando eu chorava no meu quarto, as palavras que anotaram soaram-me irônicas: Não tem importância.
“Pode ser, mas menos neste caso”, murmurei. “Eu amo Phil. Não posso viver sem ele!”
Ao acordar na manhã seguinte, porém, reli de novo a frase escrita no bloco e comecei a analisar a situação. Teria assim tanta importância? Phil, eu e a nossa felicidade, tudo isso era importante. Mas quereria eu de verdade casar com alguém que não me amasse?
À medida que os dias iam passando, descobri que a vida sem Phil continuava tendo sentido. Eu conseguia me sentir feliz e estava esperançada de encontrar outro como ele. Mesmo que isso não acontecesse, era bom saber que eu podia exercer controle sobre os meus sentimentos.
Anos depois encontrei uma pessoa muito melhor para mim. Durante os preparativos para o casamento, não precisei lembrar da mensagem “Não tem importância.” Afinal de contas, já nem ia precisar dela, pois “íamos ser muitos felizes para todo o sempre”. Não ia haver lugar para mais frustrações na minha vida.
Como são ingênuos os jovens! Casamento e maternidade sem frustrações? Cinco anos mais tarde, e três rebentos nascidos, as pressões da vida doméstica foram aumentando de tal forma que dei por mim arrancando os cabelos. Por que razão haveriam as crianças de quebrar ovos logo em cima de um tapete acabado de limpar? Por muita roupa que eu lavasse, no dia seguinte o cesto lá estava cheio de novo. E o barulho! Que inferno aquela berraria toda!
No dia do aniversário da minha filha mais velha, pensei que eu ia estourar. Precisava ainda comprar os balões e enche-los, e a festa ia começar meia hora depois. As minhas filhas implicavam uma com a outra; e antes de sair eu ainda tinha de dar dois telefonemas.
Quando desliguei o telefone, peguei no bebê e fui procurar as meninas, para leva-las comigo de carro até a loja. Não as encontrava em parte nenhuma. “Onde estarão elas?” choraminguei. Fui encontra-las com os vestidos de festa cobertos de pó de serra das obras que estávamos fazendo para ampliar nossa casa. Era serradura no cabelo e pelo chão da cozinha e da sala de jantar.
“Oh, não! Não agüento isso!” berrei. Estava prestes a dizer “Malditas crianças!” quando como um flash, aquelas palavras se estamparam no meu cérebro: Não tem importância.
Não tem mesmo importância, pensei eu. Pelo menos toda aquela que eu estava atribuindo. Olhei de novo para as pequenas e sacudi a cabeça em sinal de reprovação, mas lá por dentro estava me rindo da figura delas. Os olhos esbugalhados por me verem zangada, sobressaíam naqueles corpinhos cobertos de pó de madeira de cima a baixo.
Não tinha mesmo importância. Não valia a pena ficar aborrecida. Aquele dia especial era delas, não meu. Queria que as minhas crianças ficassem com uma boa recordação do dia do aniversário e não com a lembrança de uma “mãe aos berros”. Elas é que importavam: as minhas filhas.
“Venham cá; vamos escovar isso tudo”, disse-lhes. Reordenei os meus planos do dia e segui em frente. E a festa foi ótima, mesmo sem os balões.
Nessa noite escrevi num papel as palavras “NÃO TEM IMPORTÂNCIA” e afixei-as num painel que tenho na cozinha. Jurei que não ia mais esquecer essa mensagem.
Algumas semanas mais tarde, eu e o meu marido recebemos más notícias. Tínhamos investido o dinheiro das nossas poupanças num negócio que não deu certo.
Meu marido leu a carta para mim, saiu da sala e fechou-se a sós no seu escritório. Eu podia vê-lo através da porta do hall, com a cabeça entre as mãos. Comecei a sentir um aperto no estômago à medida que a amargura se apoderava de mim. Foi então que me lembrei das três palavras mágicas: Não tem importância.
Puxa! Pensei. Desta vez podem ter a certeza de que tem importância. Quando, porém, comecei a ouvir o nosso filhinho bater com os cubos de brincar uns nos outros, minha atenção desviou-se para ele. Por trás dele, do outro lado da janela, as meninas estavam fazendo um castelo de areia, numa animada brincadeira em conjunto. Mais longe, para lá do quintal, os bordos recortavam-se no límpido céu azul. Senti o aperto no estômago desfazer-se e a paz retomar o meu espírito. Pouco depois estava sorrindo. E não tardou que eu fosse ter com o meu marido para o animar: Não há de ser nada. Foi só dinheiro, e, pensando bem, que importância tem.
Ao longo de uma vida, há muitas coisas que tem a sua importância. Os nossos valores, por exemplo. Deus importa. A nossa pessoa também. Existem, no entanto, muitas outras coisas que ameaçam a nossa paz de espírito e a nossa felicidade mesmo sem terem importância – pelo menos toda a que lhe atribuímos. É só preciso eu não me esquecer nunca disso.

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