segunda-feira, maio 7

O humor de Abraão Lincohn

Fonte : Revista Seleções
Data : Março de 1973
Autor : Mort R. Lewis

Rir é próprio do homem, disse um clássico francês. Mas quanta gente que se julga importante desconhece essa verdade salutar?

Abraão Lincoln sempre recorria ao humor para alcançar seu objetivo. Como disseram os seus contemporâneos, o humor, para ele, era “uma linha de menor esforço” e uma “ferramenta para todo serviço”. Mas não era só isso. Ele tinha uma rica veia de humor, que alimentava o seu élan vital e sustentava a sua individualidade.
Fazer graça a respeito da sua estatura, por exemplo, sempre provocava risos e rendia-lhe vantagens em termos de simpatia entre o eleitorado. E também o ajudara a sair de dificuldades quando não queria falar de política em público antes da posse. Uma vez, o comprido presidente eleito, numa parada de trem a caminho de Washington, apresentou a esposa à multidão que se formara para vê-lo, e disse apenas que estavam ali para mostrar “o alto e o baixo” da vida. O efeito foi hilariante. Não sendo homem para perder um bom instrumento de riso, Lincoln depois repetiu a piada a uma multidão na capital, e obteve o mesmo resultado.
Contrastando com essas tiradas inocentemente cômicas, ele era capaz também de observações cortantes. Vejam esta definição que ele deu de um conhecido tagarela do tempo: “Como ninguém, ele sabe comprimir poucas idéias numa cachoeira de palavras.” De um sujeito vaidoso cujo enterro atraiu enorme multidão: “Se o General X soubesse que ia ter um enterro tão concorrido, teria morrido há muito tempo.”
Em 1862, um membro de uma delegação de clérigos de Chicago insistiu com ele para baixar uma Proclamação de Emancipação, dizendo: “É uma mensagem do nosso Divino Mestre, feita por meu intermédio, mandando que o senhor abra as portas da escravidão para que os escravos saiam livres.” Apesar de simpático à Emancipação, Lincoln respondeu que, se quilo era mesmo “uma mensagem do nosso Divino Mestre, não era estranho que a única via que Ele encontrou para manda-la tenha logo passado por aquela cidade do mal que é Chicago?”
Às vezes, ele recorria ao humor para indeferir um pedido, achando que assim adoçava um pouco o desapontamento do pretendente. Uma vez, ele sofreu pressão para nomear determinado candidato a um importante posto diplomático nas Ilhas Sandwich (Havaí), não apenas por ser o candidato competente, mas também por estar muito doente e necessitar de uma mudança de clima. Em sua carta, Lincoln respondeu que havia mais oito candidatos pleiteando o cargo, “todos mais doentes que o vosso”.
Lincoln descobriu que o humor era muito útil também nos tribunais. Ao defender um cliente acusado de assalto à mão armada, ele interrogou uma testemunha de vista. O ferimento era um mero arranhão, mas a testemunha ficou tão empolgada com a própria retórica que afirmou que a briga se desenvolveu em meio hectare de terreno. Lincoln deixou que ela falasse, depois perguntou calmamente: “Você não acha que foi pouca briga para muito terreno?” Os jurados acharam graça e absolveram o réu.
Outra ocasião, depois de um julgamento que durou até tarde da noite, Lincoln encontrou-se na manhã seguinte com o advogado que fora seu adversário no tribunal e perguntou-lhe qual tinha sido o resultado do julgamento.
“Foi tudo para o Inferno”, respondeu o advogado de mau humor.
“Bem”, disse Lincoln. “Você pode pedir revisão lá mais tarde.”
Lincoln às vezes saía-se com uma observação do mais alto humor – aquela que além de espirituosa é também verdadeira. Quando ele morava em Springfield, um vizinho viu-o saindo de casa com um filho pequeno debaixo de cada braço, os garotos soltando gritos ensurdecedores.
“Que é que está havendo?” perguntou o vizinho.
“O mesmo que está havendo com o mundo inteiro”, respondeu Lincoln. “Eu só tenho três nozes, e cada um quer duas.”
O campo do humor de Lincoln foi invadido pelo mato dos apócrifos. O próprio Lincoln disse que cinco sextos das piadas atribuídas a ele nunca saíram da sua cabeça. Mas uma das facetas do seu talento era a sua capacidade de pegar uma piada antiga, espana-la e dar-lhe o aspecto de nova. Às vezes, ele recorria a um velho livro de piadas, o Joe Miller’s Complete Jest Book. Foi lá que ele se inspirou para a história de um governador estadual que, visitando uma prisão, perdoou o único detento que reconheceu ter merecido a pena, e explicou: “Não quero você aqui dando maus exemplos a toda esta gente boa.” Na versão do Joe Miller’s, o caso era contado como tendo acontecido com o vice-rei de Nápoles, que libertara um escravo de galé.
Lincoln gostava de rir, e disse que sem isso morreria.

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