segunda-feira, julho 2

Como conversar com qualquer um, a qualquer hora, em qualquer lugar.

Fonte : Revista Seleções
Data : Agosto de 1998
Autor : Larry King

Dicas inspiradas do rei das entrevistas da televisão a cabo.

Eu jamais quis ser outra coisa a não ser locutor de rádio, entrevistador. E há 40 anos é exatamente isso que faço. Para mim, a capacidade de falar bem é um dos grandes prazeres da vida e pode proporcionar algumas das maiores gratificações.
Não estou dizendo que seja sempre fácil. A maioria das pessoas iria preferir saltar de um avião sem pára-quedas a sentar-se junto a um desconhecido em um jantar.
No entanto, quanto mais você se dedicar, mais fácil será. Como iniciação, eis aqui seis ingredientes básicos para se aprender a conversar com qualquer um, a qualquer hora, em qualquer lugar.

Não é preciso dizer algo digno de ser citado
Se você houvesse testemunhado minha primeira manhã como locutor de rádio, teria apostado que eu seria o último sujeito a sobreviver – quanto mais prosperar – como apresentador profissional.
Foi na WAHR, pequena estação de rádio em Miami Beach, na manhã de 1º de maio de 1957. eu costumava fazer ponto ali na esperança de entrar de penetra naquele mundo do rádio dos meus sonhos. Embora o diretor houvesse gostado de minha voz, não havia vagas.
Eu morava perto da estação e ia para lá todos os dias, a fim de observar os disc-jóqueis, os locutores dos noticiários e de esportes. Três semanas depois o disc-jóquei da manhã pediu demissão. O diretor me disse que o emprego era meu a partir de segunda-feira.
Não dormi durante todo o fim de semana. Fiquei ensaiando o que dizer. Na segunda-feira, estava com os nervos em frangalhos.
O gerente me chamou em sua sala para me desejar boa sorte. E logo eu estava no ar.
Imagine eu, às 9 horas da manhã, sentado no estúdio, com minha nova canção-tema. Swinging’ down the lane, dos Les Elgart.
Coloco a canção no ar. Vou então diminuindo o volume para poder falar. Só que não sai nada. Sinto a boca seca.
Aumento o volume e abaixo-o outra vez. Nenhuma palavra sai ainda da minha boca. Acontece uma terceira vez. Meus ouvintes escutam apenas o volume do som do disco, aumentando e abaixando.
Por fim o diretor exasperado abre a porta da sala de controle com um pontapé e grita: “Este é um negócio de comunicações!” Vira-se e sai, batendo a porta.
Naquele instante, inclino-me para o microfone e digo: “Bom dia. Este é meu primeiro dia no rádio. Pratiquei durante todo o fim de semana. Mas a boca está seca. Estou nervoso. O diretor acabou de abrir a porta com um pontapé, dizendo: “Este é um negócio de comunicações.”
Naquela manhã eu não falei nada digno de ser citado, mas consegui externar algo relatando aos ouvintes o aperto em que me encontrava, e aquilo me deu confiança para continuar. O restante do programa – assim como minha carreira – seguiu bem.

A atitude é importante
Depois do fiasco em Miami, comprometi-me a continuar a falar mesmo quando não me sentisse à vontade – em outras palavras, dedicar-me a isso. A atitude correta – a vontade de falar – é crucial para quem quer se aperfeiçoar como locutor.
Acredito que tenho relativo sucesso no rádio porque a audiência percebe que adoro o que faço. Não é algo que se possa fingir. E se alguém tentar, vai fracassar.
Tommy Lasorda, o antigo dirigente dos Los Angeles Dodgers, apresentou-se certa vez em meu programa de rádio na noite após a derrota esmagadora de seu time no jogo de desempate da Liga Nacional. Pelo entusiasmo dele, não se poderia jamais imaginar que era o dirigente do time perdedor.
Quando lhe perguntei como conseguia se mostrar tão exuberante, respondeu: “O melhor dia da minha vida é quando dirijo um jogo vitorioso. O segundo entre os melhores dias da minha vida é quando dirijo um jogo perdedor.” Aquele entusiasmo e a disposição de compartilha-lo tornaram-no um dirigente bem sucedido e, a propósito, alguém que se comunica muito bem falando.

Não se esqueça de fazer revezamento.
Escutar cuidadosamente faz de você um interlocutor melhor. Boas perguntas são a marca de bom entrevistador.
Na verdade, tenho uma regra importante que procuro relembrar todas as manhãs: nada do que eu disser neste dia vai me ensinar alguma coisa. Assim, se eu quiser aprender, vou ter de escutar.

Amplie seus horizontes.
Os melhores na arte de se expressar oralmente são capazes de falar sobre temas e experiências que vão além de seu dia a dia. Você pode expandir seu mundo com viagens, mas é possível faze-lo também sem sair do próprio quintal.
Quando eu era criança, minha mãe, viúva, contratou uma senhora de idade para cuidar de nós enquanto lutava para ganhar dinheiro para alimentos, roupas e manutenção de nosso pequeno apartamento. O pai dessa senhora lutara na Guerra da Secessão e, em sua infância, ela vira Abraham Lincoln em carne e osso. Gostava de conversar com ela e assim minha infância, de certa forma, foi uma janela para outra era na História.
O importante é isso: pessoas com passado diferente podem ajudar a ampliar seu repertório de conversa e sua maneira de pensar.

Mantenha um clima descontraído.
Uma de minhas regras fundamentais de conversação é nunca ficar muito sério durante longo tempo. Da mesma forma, uma das qualidades vitais em qualquer possível convidado é o senso de humor, preferivelmente auto-depreciativo.
Frank Sinatra foi um convidado que nunca teve medo de rir de si mesmo.
Durante uma entrevista comigo, Sinatra lembrou-se do episódio em que o comediante Don Rickles se aproximou de sua mesa em um restaurante de Las Vegas para pedir um favor. Rickles jantava com uma colega.
“Você se importaria de dar um “alo” para ela, Frank?”
“Claro que não”, respondeu o cantor. “Traga-a aqui.”
Rickles lhe disse então que a amiga ficaria ainda mais impressionada se Sinatra fosse até a mesa deles. Assim, pouco depois, Sinatra complacentemente atravessou o restaurante e deu um tapinha nas costas de Rickles, dizendo-lhe como estava radiante em vê-lo.
Ao que Rickles contestou:
“Cai fora, Frank. A conversa aqui é particular.”
O fundamental da história – e o que a torna mais atraente para a audiência – é que Sinatra obviamente gostava de recontar esta anedota.

Seja autêntico
Qualquer um com quem eu tenha conversado mais do que alguns minutos conhece, no mínimo, dois dados a meu respeito: que sou do Brooklyn, Nova York, e que sou judeu. Isso porque me sinto profundamente orgulhoso de ambos.
Você deve ser tão aberto e franco com seus interlocutores quanto gostaria que eles fossem com você, dispondo-se a revelar seus antecedentes, suas preferências e aversões.
Regis Philbin e Kathie Lee Gifford, que tem seus próprios programas de entrevistas, transmitem naturalidade, sem medo de revelar seus gostos ou de contar histórias a seu respeito. Sem se tornarem o centro da conversa, eles são autênticos. Se eles próprios – ou um convidado – contarem uma história triste ou feliz, nenhum deles tem medo de demonstrar seus sentimentos.
Mel Tillis, o famoso cantor de música country e western, é um entrevistado positivamente encantador, apesar de gago. Não se nota quando ele canta, só quando fala.
Em vez de permitir que isso o aborreça, Mel é franco em relação ao problema, brinca a respeito e está tão à vontade consigo mesmo que deixa também os demais à vontade.
Aprendi algo vital no primeiro dia de locutor depois de sobreviver ao episódio de “pavor de microfone”: seja franco e estará no caminho certo.

As regras são as mesmas, esteja você falando com uma só pessoa ou com um milhão. Tudo se resume a estabelecer conexão. Demonstre empatia, entusiasmo e disposição de escutar, e nada o impedirá de se tornar um mestre na conversação.

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