sábado, abril 14

Laços de ternura e sabedoria

Fonte : Revista Seleções
Data : Novembro de 1999
Autora : Mary Pipher

Por que é importante reunir jovens e idosos

Até pouco tempo, a maioria de nós convivia com pessoas de todas as gerações. Hoje podemos vir a ter contato com os idosos apenas quando nós mesmos estivermos relativamente velhos.
Isso porque agrupamos as pessoas pela idade. Colocamos as crianças de 3 anos em creches, as de 13 em colégios e centros esportivos, e as pessoas de 80 em lares para idosos. Por que?
Segregamos os idosos por muitos motivos: preconceito, ignorância, falta de boas alternativas. Os mais jovens às vezes evitam os idosos para fugir do medo de envelhecer e morrer. A morte é mais fácil de suportar quando é abstrata. É muito mais duro ver alguém que amamos definhar sob nossas vistas. Às vezes é tão difícil que nos afastamos daqueles que mais precisam de nós.
No entanto, essa experiência de segregação por idade traz alguns problemas. Dez adolescentes de 14 anos reunidos formarão uma cultura como a descrita no livro O senhor das moscas: competitiva e mesquinha. Mas dez pessoas entre 2 e 80 anos agrupadas estabelecerão uma hierarquia etária natural que irá nutrir e ensinar a todos. Para nossa saúde mental e social, precisamos reunir os grupos etários.
Felizmente, alguns de nós encontraram o caminho até os mais velhos. E descobriram que eles muitas vezes salvam os jovens.
Uma repórter mudou-se com a família para um quarteirão onde moravam muitas pessoas idosas. A princípio, as crianças ficaram decepcionadas. Mas a mãe fazia pães para os vizinhos e mandava os filhos entregarem e fazerem visitas. Em breve as crianças tinham muitos amigos com quem partilhavam comidas, histórias e planos. “Nunca mais meus filhos se sentiram sós”, diz a repórter.
Os jovens, por sua vez, também ajudam os velhos. Certa vez, eu estava numa casa de repouso quando uma visitante chegou com um bebê. Imediatamente se formou um círculo à sua volta. De repente, pessoas que não deixavam a cama havia uma semana tocaram a campainha, pedindo uma cadeira de rodas. Mesmo os que pareciam letárgicos despertaram para olhar a criança. Os bebês tem uma capacidade espantosa de confortar e curar.
Os avós constituem um caso à parte. Transmitem aos netos uma sensação de segurança e continuidade. Como diz meu marido: “Meus avós me davam a profunda impressão de que no fim tudo acabaria bem”.
Os netos falam da atenção que não recebem dos pais estressados. “Meus pais estavam sempre me apressando, e meus avós me diziam para ir com calma”, contou um amigo. Uma professora me disse que sabe quais crianças convivem com os avós: são mais tranqüilas, mais calmas, mais confiantes.
Conheci uma artista, que chamarei de Maeve, que sempre buscou a verdade longe de casa, em templos de meditação orientais e seminários. Certa vez, quando ela estava de partida para a Europa, a avó adoeceu e a família pediu que Maeve cuidasse dela. A neta protestou, porém não havia mais ninguém disponível. Maeve morou com a avó durante seis meses – atendendo as suas necessidades médicas, cozinhando e dando-lhe banho – até ela morrer. Pela primeira vez na vida, a preocupação de Maeve com outra pessoa era tão grande quanto a que tinha consigo mesma. A experiência modificou sua vida muito mais do que terapias e gurus.
Minha vida também foi enriquecida pelo tempo que passei com meus parentes idosos. Nos últimos três anos, entrevistei minhas cinco tias, ouvi histórias da família, vi fotografias e fiz refeições caseiras. Assim, hoje compreendo melhor meus próprios pais e a história de nosso país.
Aprendi também a arte de envelhecer. Passei a aceitar melhor os fatos, a ser mais agradecida. E fui testemunha da incrível equação da velhice: quanto mais se tira, mais amor se tem para o que restou.
Para aprender com os idosos, é preciso amá-los – não apenas abstratamente, mas em carne e osso – ao nosso lado, em casa, no trabalho, na igreja e na escola. Devemos trabalhar juntos para construir comunidades que nos permitam cuidar uns dos outros.

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