segunda-feira, outubro 2

"Criança morrendo sufocada!"

fonte : Revista Seleções
data : Dezembro de 1981
autores : Lês Brown e Anname Cheney

Para salvar aquele bebê ele tinha de vencer uma vala imensa e funda, e depois uma encosta violenta. Era impossível!

Palavras tão temidas: “Criança morrendo sufocada! Código Três!” Reagi imediatamente, fazendo piscar as luzes vermelhas do meu carro e ligando a sirena, enquanto a central dava instruções. Logo comigo!, lamentei, enquanto acelerava.
Mas começara para mim o dia de trabalho como auxiliar de xerife em San Diego, Califórnia. Era até meu dia de folga, e eu tinha sido convocado para substituir um outro policial que estava doente. Não sabia quase nada sobre aquela área de ronda e tinha pensado em dar umas voltas para me familiarizar com a zona. Agora, logo a minha primeira chamada era de uma emergência de vida ou morte, a quilômetros de distância!
Resolvi seguir pela auto-estrada inacabada: era quase impossível furar o tráfego na estrada 101. logo adiante ficava a rua que me levaria ao meu destino. Foi nesse exato momento que a angústia tomou conta de mim: não havia rampa de descida! Entre eu e a rua havia uma vala imensa e funda, e depois uma encosta violenta.
Os pneus cantaram quando parei com o pisca-pisca ainda ligado. Saí do carro e olhei o movimento intenso da estrada lá embaixo.
Santo Deus!, pensei, contendo um grito. Não há tempo para arranjar outro carro. Que é que eu vou fazer?
“Qual o problema, seu guarda?”
Levantei os olhos e vi um homem sentado no alto de uma gigantesca escavadeira. Devia estar, no mínimo, na altura do segundo andar de um prédio.
“Uma criança engasgada está morrendo! Tenho de chegar lá embaixo, mas não há estrada. Se eu der a volta, não vou chegar a tempo!”
Anos de disciplina haviam-me ensinado a controlar minhas emoções, mas aquilo era horrível!
“Venha atrás de mim. Vou fazer uma estrada para o senhor.”
Arranquei atrás do homem da escavadeira, intrigado com o que a sua máquina monumental seria capaz de fazer. Ele então jogou na vala a terra que enchia as caçambas.
Depressa! Depressa! O relógio era o meu inimigo.
A escavadeira desceu a longa encosta inclinada, espalhando a terra. Nuvens de poeira nos envolviam. Pareciam horas, mas realmente durou pouco tempo até a escavadeira descer, lenta, chegar à auto-estrada e bloquear o tráfego.
Percorri em alta velocidade, com a sirena uivando, os poucos quarteirões que me separavam do endereço que me haviam dado. Quando atravessei a porta correndo, uma mãe aterrorizada entregou-me seu bebê. Já estava roxo. Eu tinha chegado tarde demais! Santo Deus!
Tudo que recordo dos segundos que se seguiram foi que o agarrei e automaticamente executei os movimentos de socorro de emergência que me haviam ensinado. Um objeto voou da garganta da criança e caiu no chão; era um botão, que felizmente deixava passar um pouco de ar para os pulmões.
Um bombeiro entrou na sala correndo.
Precioso oxigênio.
O bebê gritou, ficou vermelho, sacudiu os minúsculos pulsos. Estava zangado, mas bem vivo.
De volta à viatura, registrei a ocorrência, comuniquei-a pelo rádio e fui embora, abalado mas feliz.
Olhei para cima. Obrigado, pensei, sem falar.

Há poucos dias eu tinha pensado se a vida de policia vala mesmo a pena: hostilidade, criminosos, rebotalho da sociedade; coisas insignificantes que roubavam tempo e energia para serem resolvidas... Era um trabalho ingrato. Era isso o que eu queria?
Com a ajuda de Deus, porém, eu acabara de salvar uma vida, e começava a ver com outros olhos minha própria vida. Aquele pequenino em perigo me ensinara que eu tinha um trabalho importante a fazer.
No dia seguinte aproximei-me do lugar onde estivera desesperado 24 horas antes. Diminuí a velocidade do carro ao ver a escavadeira.
Queria agradecer ao motorista.
Ele correu para mim e murmurou: “O ... o bebê...” Calou-se, emocionado demais para falar.
Surpreso com a sua emoção, tentei consola-lo: “Ele está ótimo. Graças a você. Você me ajudou a salvar a vida dele. Moço, aquilo é que é trabalho de equipe!”
Ele engasgou. “Eu... eu sei. Mas o que eu não sabia naquela hora era que...” Mordeu com força os lábios e acrescentou num sussurro: “Aquela criança era o meu filho.”

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